Pesquisar este blog

quarta-feira, 14 de abril de 2010

Transitoriedade Perene



Uma mulher linda e jovem vinha contornando a lago do Ibirapuera, pensando sobre o ciclo da vida: “Embora tenhamos a sorte de nascermos, vivemos, mas tudo que nasce tem o seu fim, morre... tudo está em constante movimento.”

Aquela tarde, naquele arrebol, a linda moça chegava a sentir, em sua pele suada, o fresco ciclo do vento que balançava as flores e lhe fazia pensar no banho morno, este lavaria mais um dia de cansaço e logo que saísse buscaria o fresco lençol e no seu leito repousaria consigo as lembranças de um dia fatigante.

No estacionamento do parque, como de costume, Stefany sempre doava uma moeda para um mendigo que há tempos morava ali, nas proximidades do parque. A moeda que ela entregara aquele homem, não era compaixão, era amor pela crença na teoria de que tudo que é nosso sempre acaba voltando para nós. A moeda é um objeto que não para de circular pelas mãos das pessoas efêmeras.

Aquele homem sorriu para ela e disse:
- Nada está parado, um dia vou sair daqui, que Deus dê a você a proteção que merece e retribua a benevolência.
Amargurada pelas palavras sábias do humilde homem fingiu não tê-lo escutado e saiu pensativa, rumo ao seu Audi 2009.

Dirigia devagar numa velocidade que ajudava a sonolência, não precisava prestar muita atenção, o pouco movimento da avenida permitia divagações. Entrou na Avenida Brigadeiro, passou por um bar cheio de homens “metafísicos”, horríveis, que fixaram os olhares não para o Audi e sim para Stefany, que possuía uma beleza angelical, um olhar esnobe, meigo e traiçoeiro de um brilho a enlear, claro que atrairia a atenção de qualquer homem.

Entre aqueles homens, estava o mais maduro deles, o mais sábio, aquele homem cujo nome era conhecido por todos como Vladimir, dono de uma exuberante Harley Davidson. Ele era um lobo na pele de carneiro, dono de uma beleza invejável que atrairia e trairia o olhar de qualquer mulher.

Enquanto os “metafísicos” planejavam assaltá-la, Vladimir estava “anos luz” à frente, pois, ele já marcara cada passo de Stefany, sabia para onde ia, de onde vinha, do que gostava de fazer após os passeios no parque do Ibirapuera; sondara todo ciclo histórico de sua família até a extremidade de sua árvore genealógica.

Naquele instante Vladimir percebia que era o grande dia, talvez o único momento para surpreendê-la de tal forma que mesma a antipatia da moça não conseguiria afastá-lo.

Vladimir montou em sua Harley e acompanhou de longe a perseguição.

Aqueles três homens medonhos do bar estavam atrás de Stefany, muito próximos, mas ela não percebera nada, estava na sua rua próximo do seu magnífico edifício, não tinha nenhuma alma viva naquele instante sombrio. Antes mesmo que ela guardasse o carro aqueles a surpreendeu; estagnada ficou sem nenhum movimento de reação, somente a palidez do olhar abalado dizia da sua raiva, de sua revolta, do seu ódio contra aqueles nojentos asquerosos. Um daqueles homens se aproximou do carro, fedia suor, cerveja e maconha, apontou o revólver para Stefany, gritando com sua voz ruidosa:
- Saia do carro!
Stefany saiu trêmula e os outros dois a pegaram fortemente pelo braço e sussurraram ao pé do ouvido:
- Você é a gostosa da vez, dá seu cartão e sua senha, sabemos que está na sua bolsa, dá para nós agora mesmo.

Assustada entregou tudo para os bandidos, mas o que eles não esperavam, quase todos, é que Vladimir acionara a polícia. Ele já estava no local a espera de um descuido dos ladrões, e foi assim que aconteceu. O homem que estava com a arma foi surpreendido com um golpe de Vladimir, que em seguida pegou a arma do bandido, enquanto estava desacordado, atirou para cima e os outros dois fugiram sem hesitar. A polícia chegou ao local e prendeu Vladimir, equivocadamente, Stefany se desprendeu do seu transe e gritou:
- Esse homem não tem culpa, ele me salvou das garras desses loucos, se não fosse ele, certamente, vocês não me encontrariam viva!

Atordoados com tal discurso, os policiais pediram desculpas para o herói e em seguida, prenderam o ladrão desacordado e disseram para os dois que não precisaria de testemunhas, porque era assalto à mão armada; o colocaram no camburão e foram para o seu destino.

Anteriormente aquele mesmo indivíduo havia sido preso, mas como não tinha prova suficiente para prendê-lo. Era um ciclo vicioso, prendia e soltava, mas agora os policiais estavam felizes porque aquela arma era prova suficiente para prendê-lo de uma vez por todas.

Vladimir ficou com os olhos fixos em Stefany como se quisesse dizer algo, esta se aproximou dele e deu-lhe um beijo nas proximidades da boca, como forma de agradecimento. Vladimir por sua vez abaixou rapidamente e pegou a bolsa da moça sem tirar os olhos dela e disse:
- Stefany, certo?
- Como sabe?
- Há muito tempo venho te sondando, por exemplo, dias atrás você recebeu um buque de orquídea, não foi?
- Sim.
- Ontem, você recebeu um envelope com uma carta anônima, cujas palavras descreviam um amor platônico de um admirador que faria tudo para conseguir sua admiração e como prova desse amor junto à carta continha um brasão com a árvore genealógica de sua família. Digo-lhe que somente aquele que ama busca saber e valorizar a essência da pessoa amada, não valoriza o que ela tem e sim o que ela é. Você recebeu? Abriu? Eram essas palavras? Percebo que gostou do brasão, vejo que está pendurada em sua bolsa.

Stefany admirada e contagiada por tamanha gentileza ficou a enamorá-lo com os olhos e após um minuto de silêncio sorrindo disse-lhe: - Além de ser meu herói e meu admirador? É o homem que pedi, sonhei e esperei.

Caro leitor não foi tão romântico, foi eficaz o jeito como ele a conquistou.

Passados três anos, Stefany estava grávida de nove meses. Vladimir já era presidente da empresa dela, tudo estava de acordo com seu plano sórdido; sem que ela soubesse 70% das ações da empresa já eram dele.

Stefany em uma tarde de domingo estava passeando no parque como de costume, foi ao estacionamento, mas dessa vez não encontrou o pobre homem que a havia feito pensar sobre sua hipocrisia, naquele instante lembrava que, quando criança menosprezava as pessoas e torcia que suas rivais padecessem nas mãos de homens horrendos; lembrou-se que tudo que ela desejara aconteceu consigo mesma, exceto a traição. Esse pensamento a perturbou, no entanto, Vladimir sempre foi um bom marido, companheiro, amigo, sempre a ajudou em todos os setores de sua vida. Ela nunca viu se quer um indício ou suspeita de traição. Ele era um herói, de fato, um supremo herói.

Certo dia, Vladimir atendeu um telefonema suspeito em seu escritório. O homem dizia assim: - Vladimir, já se passou três anos e você não me pagou, fiquei preso por dois anos e meio e até agora não deu nenhum parecer, quero acreditar que você não entrou em contato comigo, porque aqueles dois pilantras morreram e levaram com eles a sua memória. Mas, agora estou aqui reivindicando os meus direitos e espero ser atendido...
Vladimir ficou algum minuto inerte, pensativo...

O telefone tocou novamente, ainda apreensivo, resolveu atendê-lo. Era a enfermeira da maternidade que naquele derradeiro momento dava uma grande notícia: seu filho nasceu e sua mulher está bem, nós precisamos do senhor aqui, o convênio dela está pendente.
- Claro, vou correndo, chego aí em quinze minutos.
Ao chegar ao hospital perguntou de sua esposa e de seu filho, pagou o hospital e regularizou o convênio.
Estava subindo para o quarto da mulher quando um homem asqueroso o barrou interrogando-o: Lembra-se de mim?

Espantado, Vladimir disse:__ Lembro, Joel!!
__ Vejo que você está muito bem Vladimir, cadê o meu dinheiro? Seu salafrário. Sabe, acabei de visitar a Stefany é sua esposa, certo? Vladimir apreensivo disse:
__Joel, te pagarei, deixe minha família em paz...
Com o sangue nos olhos Joel o repreendeu: Família, seu idiota, nós éramos parceiros e você me traiu com essa vadia, passei anos preso para agora escutar isso, basta! Quero quinhentos mil reais e você terá menos de vinte e quatro horas para o pagamento da dívida, caso contrário... Já não preciso explicitar “certo, mano?” Joel encarou Vladimir e continuou a descer as escadas ao tom furioso dos passos.
Vladimir concordou passivamente e ficou por algum segundo pensativo, queria fugir de seus questionamentos; o local onde discutia com Joel era próximo do quarto de Stefany e esta escutara toda a conversa; Naquele efêmero instante o chão desabava.
Vladimir ao entrar no quarto foi expulso aos gritos estridentes de Stefany. Ele não teve chance de explicar, somente o seu olhar foi capaz de dizer a ela o quanto estava arrependido e o quanto a amava. Amargurado, saiu do quarto e desceu as escadas rapidamente, na porta do hospital, do lado de fora, havia um homem parado próximo de um Vectra que foi ao encontro de Vladimir perguntando:
__ Você aparenta ser o esposo de Stefany, você é?
Desconfiado, Vladimir respondeu pausadamente:
__ Sim, sou... Por quê?
__ Que bom, eu a socorri no parque, ela estava no chão do estacionamento, caída reclamando das dores, dizia que estava fraca e ia dar a luz. Fiquei preocupado, ela estava pálida e acabou adormecendo no carro. Consegui trazê-la a tempo para esse hospital, falei com a enfermeira e pedi para que ligasse para o senhor, peço desculpas por ter mexido nas coisas dela.
Vladimir o respondeu comovido:
__ Obrigado Senhor! A minha esposa está bem, de quanto o senhor precisa?
O Senhor do Vectra sorriu e o respondeu:
__ Não preciso de nada só a graça de Deus me basta, mas gostaria que o Senhor avisasse a sua esposa de que o homem que ela ajudou deu a volta por cima.
O homem entrou no seu Vectra e recomendou-lhe:
__ Vladimir, a vida é cheia de altos e baixos, não desista do amor, nunca desista de amar, você nunca sabe quando será chamado, talvez agora, alguns minutos, horas, quem sabe? Nunca é tarde para recomeçar.
Aquele homem misterioso deixou marcas em Vladimir , assim como havia deixado marcas em Stefany, ligou o carro e foi embora.
Vladimir entrou no seu carro e foi à igreja, no quarteirão próximo havia uma multidão na rua; Era um atropelamento, a polícia estava lá junto do corpo caído, para a surpresa de Vladimir era o seu amigo traído que estava ali, morto. Vladimir parou o carro e foi ao encontro de Joel. O celular de Vladimir tocou. Ao atendê-lo, tomou um choque, paralisado em profundo êxtase, seus olhos enchiam d’água como se estivesse perdendo a própria vida, pois acabava de receber a trágica notícia, de que sua mulher havida falecido no leito do hospital de hemorragia interna.
Ao tentar sair da cama às pressas Stefany caiu, não chamou ninguém, havia um bilhete: “Cuide de nossa filha, assim como fez comigo. Eu te perdoo”.
Passados alguns anos... Eliza e seu pai costumavam passear no parque e sempre que iam lá contornavam o lago do Ibirapuera. Eliza sempre estava com o medalhão onde quer que fosse. O medalhão trazia à memória de Vladimir o amor inefável de Stefany.


OBS: Elisa, Eliza: Variação de Elisabete. A franqueza é a marca registrada da pessoa que tem esse nome. Mesmo que às vezes lhe traga alguns problemas, sua tendência a dizer sempre o que pensa revela uma grande qualidade: o apego à verdade. Na maturidade, torna-se mais diplomática, mas continua sentindo aversão pela mentira.

Jonny William

Nenhum comentário:

Postar um comentário